Hoje o dia está ensolarado!
Eu tenho duas avós, a vó Norma e a vó Délia. São duas flores da minha vida. Uma é morena e magra a outra nasceu grisalha e gorda. Uma tem sobrenome Italiano, Magnani, a outra também, Rigotto. Eu amo muito as minhas avós. Tenho os cabelos e as formas da primeira e o rosto arredondado e “uma” possibilidade de obesidade da segunda. Os meus olhos são iguais aos da tia Helena Sanches(mas essa é outra história).
Ao falar diziam: você come pouco; tá muito magra; não vai arrumar namorado sendo tão brava; melhor casar com um rapaz daqui; para que estudar tanto; deixa que eu faço; não namore no escuro; não dê beijo de língua; como essa menina é interesseira (“rs. Interessada, vó!”); fulano está transando com sicrana(“namorando vó!”), não é a mesma coisa? (“rsrs”); pra Dani: ovo e polenta mole (“ai, que saudade!”); as mulheres são assim; os homens não prestam; seu avô parece o Clark Gable (“rsrs e você, vó, a Anna Magnani”);de novo lavando louça para o seu vô!!; nunca beijei antes do casamento (“sei. Ainda bem que sou confidente do vovô, né?”); comprei banana pra você... vê se deixa para suas irmãs; cachorro não casa com girafa, filinha; ainda bem que engravidou; vai casar com um menino bom... de boa família; todas as “refeições” na hora certa, senão marido reclama, heim?; é bom o neném mamar toda hora; cure a ferida com a dor; é bom que “gorpe” sinal que vai engordar; é bom chorar... abre os pulmões; você é muito brava com esse menino... coitadinho; eu falava para sua mãe: não crie essa menina como homem; deu no deu;...
A Norma, que não tem esse nome à toa, morria de medo de viver. A melhor rosca de coco que já comi foi embora com ela, porque a amargura nos caí bem, vó. Quando ela morreu, eu lia “Cem anos de Solidão”, passei meses insones com medo, mas lembro que abracei uma árvore e ela amanheceu toda florida. Dela herdei uma leve dificuldade em relacionar-me, tanto que todas as vezes que sou “dura” escuto: você é neta da Norma, não é? Ah... também a paixão por filmes antigos, aqueles que o mocinho “pega” a mocinha de jeito e dá aquela beijo que faz ela dobrar ao meio. A beleza, infelizmente, não ficou comigo. Mas foi com ela que aprendi quase sem saber/nem querer, a ser má... e duvidar do mundo.
A Adélia morria de medo de morrer, era um drama: “ai, não vou conhecer meus netos, nem meus bisnetos”... Só falava em morte... rsrs era engraçado. Um dia me disse: “olha, Dani, quando todos a nossa volta da mesma idade começam a morrer... esquece!!” Essa ansiedade dramática herdei dela. O colo mais quente do mundo, do meu pelo menos... (ai, que saudade!). Ela era mágica, transformava coisas simples em únicas... o arroz comum era o melhor do mundo, o pudim de pão o mais saboroso, o domingo à tarde o mais inesquecível, o cafuné remédio para qualquer dor, o bolinho de chuva um motivo para ter amigos... A paixão por fotos de família em preto e branco, paquerar os casais apaixonados, aqueles que andam de mãos dadas depois dos cinqüenta anos de casamento, aprendi com ela...
Eu: Elas me incentivaram a fazer coisas que faria de qualquer jeito, porque sou teimosa, isso eu herdei das duas.