quarta-feira, 29 de abril de 2009

Tecer

"Aracne"



Na cidade tem tear. Teares manuais, teares a ar.
Teci um pedaço de pano no tear manual. Ele precisa de alguém atento aos erros, às falhas, às cores(...) aos caminhos dos fios que levam ao tecido. Olhos observadores no que passou e no que ainda vai passar. Os ares eram de poesia antes e depois, música suave e um jardim que podia ser visto através da parede de vidro. Antes de começar a tecer descíamos até as roseiras para olhar as teias das aranhas...... no ateliê!!??
O tear a ar só vi. Para cada 100 máquinas uma pessoa para vigiá-las. Vigia-se, observa-se a quantidade, a qualidade, o tempo, os cons(c)ertos, tudo durante um dia longo de trabalho.
Em outro lugar, certa vez, conheci uma urdideira, amei este nome “urdideira”. A pinçadeira trabalha ao lado da urdideira, são amigas. Eu as conheci em uma fábrica, lá o chão é sujo e tem um relógio enorme no centro do barracão. Faz muito barulho no lugar, doem os ouvidos. Os tecidos prontos são separados entre os com defeitos e os sem defeitos. O verdadeiro tecelão fala alto, gritado. Isso me irrita profundamente, tenho medo de ficar “surda” como ele ficou com barulho das máquinas. Às vezes meu pensamento fica sem eira nem beira... Palavras "engendram" palavras que pensam o pensamento...
Outras palavras só existem... pinçadeira, cortadeira de cana*, enfermeira, costureira, faxineira, bordadeira, empilhadeira, biscateira,(...) Por que será que não é atendedeira de telefone (depessoas) e sim “recepcionista”? Por que será que não é mediqueira, e sim médica?, pois se as curandeiras existem... Mas é engenheira, e engenheiros constroem coisas, pontes, etc...




sexta-feira, 24 de abril de 2009

Diálogos

"O Grifo e a Falsa Tartaruga
A Falsa Tartaruga prosseguiu:
- Fomos educados da melhor maneira... De facto, íamos à escola todos os dias...
- Eu também vou à escola todos os dias. Disse Alice.
- Não é preciso envaideceres-te tanto com isso. Continuou ela.
- E tinhas disciplinas suplementares? Perguntou a Falsa Tartaruga ansiosamente.
- Tinha. Aprendíamos Francês e Música. Respondeu Alice, indignada.
-Ah! Então a tua escola não era lá muito boa!- disse a Falsa Tartaruga, muito aliviada.
(...) - Segui apenas o curso normal. Prosseguiu a Falsa Tartaruga.
- Em que consistia? Inquiriu Alice.
- Reler e Escrevinhar, é claro, para começar, e depois os diferentes ramos da Aritmética: Ambição, Distracção, Desfeamento e Escárnio. Respondeu a Falsa Tartaruga.
- Nunca ouvi falar de Desfeamento! Atreveu-se Alice."(Alice no País das Maravilhas)

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Ninguém no mundo

Não existe no mundo ninguém que perdeu mais tempo comigo do que eu mesma. Portanto. Não diga de mim como se me conhecesse. Não pense meus pensamentos, nem sinta os meus sentidos. Olhe-os de fora. É somente o que permito a você, que me acompanha e pensa saber de mim. Quero alguém que mesmo com a permissão (de)... recuse-se (de*) fazê-lo.
*não sei o que usar para re-ligar estas palavras. Preciso reler, revisar... meus textos, meus desejos,

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Silêncio.

Tenho medo da página em branco. Construir é prever sua destruição, o imperfeito se mostra no conteúdo. O vazio leva a perfeição, como se nada fosse digno de mim. Silencio porque o som da minha voz me cala. E a cada palavra não dita o grito se abre na alma que queima...

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Por quê?

As palavras fazem cócegas na minha garganta
Querem sair, mas não se formatam
São rudes e inadequadas
Desequilibradas, reinventam a dança do "pensamento"
correm como um rio
Não.
Batem, salgadas palavras, nas pedras dos precipícios em mim
como ondas do mar
ora forte, ora suave
Independem da minha vontade.
Enjoam
E eu as vomito...

quinta-feira, 16 de abril de 2009

(de)lírios

Neruda (re)nasceu menino em um poema. Lembro quando li. Procurava outro, na verdade, mas dei de cara com a esperança que nada dizia, somente contava uma mentira de um jeito que sugeria dor. Como é horrível o começo, o meio, e o fim, de tão óbvios que são. Entediam e negam a verdade inventada e bela. Nessa ocasião procurava aflita por outro poema, porque achava que nele encontraria saídas, certezas, necessitava das minhas certezas incertas, implorava por minha verdade inventada. Bobagens de uma refugiada de si mesma. Morando nesta escuridão procurava aflita nos livros que não li indícios do nada. E muito além de tudo o nada fluía esperançoso, travestido de luz. Encontrei o caminho dos meus desejos, percorri palavras como se estivesse em um labirinto para chegar até você... Dei de cara comigo invertida. E morta, a todo instante. Minha alma suava de febre. Minha esperança sentava em um banco de jardim e balançava as pernas sem alcançar o chão. Olhava e não conseguia ver. Fiquei presa a mim, condenada aos meus pensamentos. clara maré

terça-feira, 14 de abril de 2009

Sim e Não

De(composição)


Era só uma menina
A esquecer o que não podia Ser perdoado
Era só um lamento
Lembro
Tanto faz esquecer ou lembrar.
Não muda o rumo do rio: podre e fétido
Era só uma mulher só.
Num túnel esgoto.
Cabelos trançados, vestido florido.
Andando como se nascesse.


ps: vomitei a sobra, expurguei-me de mim, desmaiei... gelei.Suei.Ufa! Acordei. Tudo essa noite!! Longa noite...rs. Aí,ai, pensei em poesia.




quinta-feira, 9 de abril de 2009

(Amor)al

Simone de Beauvoir, Nelson Algren

Rascunho:
Outro dia ao ler um artigo deparei-me com dois conceitos: amores contingentes e amores necessários. Isto organizou meu pensamento para entender aquilo que conhecia como “amor livre”. Declarar-se, em pacto, “livre” é algo bem moderno, isso que fez Simone de Beauvoir e Sartre, constituíram uma relação de amor nada convencional para as regras culturais da época, estabeleceram uma relação a mais de dois, muito além da monogamia. Pré-estabeleceram uma forma de amar a partir do amor que sentiam. Nos textos que li sobre esse assunto a imagem dela fica entre a libertária e a ciumenta, sim, dizem que ardia de ciúme, conheceu uma forma de amar diferente, e, aceitou uma forma de amar que lhe convinha. A imagem dele fica entre alguém que propôs algo diferente, que subvertia as regras sócio-culturais sobre o amor, divino amor, ou mesmo como um incorrigível frequentador de prostíbulos... Muito provavelmente este olhar tem muitos filtros. Olhar algo é sempre modificá-lo, interpretá-lo, restringi-lo ou ampliá-lo... Impossível permanecer “puro”. E fazemos tudo isso a partir do que somos. E somos porque estamos mergulhados em um mundo que nos têm e nos molda a sua imagem e semelhança.Mas adoro teorias sobre o amor. Principalmente aquela que insiste em dizer ser impossível teorizar sobre o Amor.A maravilhosa Rita Lee canta... “Amor é pensamento/Teorema/ Amor é novela/ Sexo é cinema...”Eu gosto do amor silencioso, aquele que não se declara em pacto algum. Porque de tanto amor (não sei por quê??) sou capaz de aceitar os amores contingentes, e em silêncio, não porque convencionou-se abertamente (Sartre/Simone), ou até mesmo porque ditou-nos a moral e os bons costumes (qualquer casal da esquina), mas antes de tudo porque amo o que de mim há em você, e, assim sou capaz de amar você que não há em mim. Os amores necessários são inevitavelmente contingentes. E, os amores contingentes são necessariamente inevitáveis.



segunda-feira, 6 de abril de 2009

Comida

...esvazia de sentido as palavras.

E preenche de significados os vazios de silêncio.



Silêncio?


"Aprenderia eu com ele o amplo e luminoso silêncio? Ou ele aprenderia comigo? Ou cada um de nós o "inventou" para si mesmo?" (Assim falava Zaratustra, Nietzsche)

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Inventário

Hoje o dia está ensolarado!

Eu tenho duas avós, a vó Norma e a vó Délia. São duas flores da minha vida. Uma é morena e magra a outra nasceu grisalha e gorda. Uma tem sobrenome Italiano, Magnani, a outra também, Rigotto. Eu amo muito as minhas avós. Tenho os cabelos e as formas da primeira e o rosto arredondado e “uma” possibilidade de obesidade da segunda. Os meus olhos são iguais aos da tia Helena Sanches(mas essa é outra história).

Ao falar diziam: você come pouco; tá muito magra; não vai arrumar namorado sendo tão brava; melhor casar com um rapaz daqui; para que estudar tanto; deixa que eu faço; não namore no escuro; não dê beijo de língua; como essa menina é interesseira (“rs. Interessada, vó!”); fulano está transando com sicrana(“namorando vó!”), não é a mesma coisa? (“rsrs”); pra Dani: ovo e polenta mole (“ai, que saudade!”); as mulheres são assim; os homens não prestam; seu avô parece o Clark Gable (“rsrs e você, vó, a Anna Magnani”);de novo lavando louça para o seu vô!!; nunca beijei antes do casamento (“sei. Ainda bem que sou confidente do vovô, né?”); comprei banana pra você... vê se deixa para suas irmãs; cachorro não casa com girafa, filinha; ainda bem que engravidou; vai casar com um menino bom... de boa família; todas as “refeições” na hora certa, senão marido reclama, heim?; é bom o neném mamar toda hora; cure a ferida com a dor; é bom que “gorpe” sinal que vai engordar; é bom chorar... abre os pulmões; você é muito brava com esse menino... coitadinho; eu falava para sua mãe: não crie essa menina como homem; deu no deu;...

A Norma, que não tem esse nome à toa, morria de medo de viver. A melhor rosca de coco que já comi foi embora com ela, porque a amargura nos caí bem, vó. Quando ela morreu, eu lia “Cem anos de Solidão”, passei meses insones com medo, mas lembro que abracei uma árvore e ela amanheceu toda florida. Dela herdei uma leve dificuldade em relacionar-me, tanto que todas as vezes que sou “dura” escuto: você é neta da Norma, não é? Ah... também a paixão por filmes antigos, aqueles que o mocinho “pega” a mocinha de jeito e dá aquela beijo que faz ela dobrar ao meio. A beleza, infelizmente, não ficou comigo. Mas foi com ela que aprendi quase sem saber/nem querer, a ser má... e duvidar do mundo.

A Adélia morria de medo de morrer, era um drama: “ai, não vou conhecer meus netos, nem meus bisnetos”... Só falava em morte... rsrs era engraçado. Um dia me disse: “olha, Dani, quando todos a nossa volta da mesma idade começam a morrer... esquece!!” Essa ansiedade dramática herdei dela. O colo mais quente do mundo, do meu pelo menos... (ai, que saudade!). Ela era mágica, transformava coisas simples em únicas... o arroz comum era o melhor do mundo, o pudim de pão o mais saboroso, o domingo à tarde o mais inesquecível, o cafuné remédio para qualquer dor, o bolinho de chuva um motivo para ter amigos... A paixão por fotos de família em preto e branco, paquerar os casais apaixonados, aqueles que andam de mãos dadas depois dos cinqüenta anos de casamento, aprendi com ela...


Eu: Elas me incentivaram a fazer coisas que faria de qualquer jeito, porque sou teimosa, isso eu herdei das duas.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

(trans)lúcido*

Olhares "des"temidos

O que pretende você com o meu amor? Minha cura, meu nascimento. E quem cuidará da sua cura? O amor verdadeiro cura, e, este não pré-entende nada. Não tem pretensões. Sem pré-intenções. É vazio de noções. Prenhe de soluções... Óbvio de mais.


"Moça à Janela" Salvador Dalí



Um dia sonhei que tudo fazia sentido. As palavras, as pessoas, os gestos, os lugares, os acontecimentos. O mundo era um livro inteligível, bastava olhá-lo com cuidado... da minha janela e as respostas sem perguntas, brotariam. Pessoas passavam, cruzavam, falavam e assim construíam frases inteiras compreensíveis: sem ponto, sem vírgula. Eu entendia o que lia. Aliás, a cegueira era entender o labirinto de significados. O rádio me respondia, a música me conduzia. O eu era você e o você era eu. Espelho. O mundo devolvia-me inteira, ai, que repulsa.

*Diz-se dos corpos que deixam passar a luz, mas através dos quais não se vêem os objectos com nitidez.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Olhar

Cenas e queixas*

A noite quente suava em nossa pele morna. O retorno para algum lugar familiar demorou mais que devia. Nesta demora palavras eram entrelaçadas no silêncio. Algo monótono aconteceu, surgiu, ou melhor, brotou de algum canto de horror nosso. O menor, o pior, de uma fenda insípida de respeito devorou uma saudade de compaixão que não existiu. A cabeça latejava, pulsando e estralando junto ao coração. A cama, possibilidade de sono e suave sossego para as palavras que pairavam podres e desconexas no ar. Elevou-se. Como alçapão conduzido por mãos de bicho raivoso. Ela caiu, dorso no chão, dor sem perdão. O chão escorreu por seu corpo, e ela, vislumbrou (bonito isso) uma paisagem de ponta cabeça pelas janelas do seu olhar. Ferida acessa na alma, corpo/cabeça a pestanejar no chão de concreto. Acabou. Ele saiu e voltou, o tom mudou o silêncio tocou, a dor imperou, e, o arrependimento se instalou. Corpos destruídos ardiam de raiva e furor. Força maldita da mão delicada que rasgou o que costurou. Odiou o que um dia amou: mas não se libertou. Também não implorou, só esfacelou. Objetos no chão e alguém impotente na mão. ((( E um jardim a brotar ao som da lua e das estrelas: esperança no meio da dor))) Amanheceu. Ninguém se amou. E a hipocrisia velou a dor. (clara maré)

*Maria Filomena Gregori. O estudo trata das cenas da chamada guerra conjugal: agressão e espancamento de mulheres por seus maridos. A autora analisa o discurso queixoso das vítimas, bem como a trajetória de uma entidade feminista de apoio e conscientização - SOS Mulher de São Paulo.


à querida Léa, mais que amável, minha amiga de luta... que acha que rimar a linha de baixo com a de cima é pura ilusão: prefere as “armas”...rs Que me deu esperança, de graça, está semana... obrigada!!

diga (não) a violência. Denunie: disque 180...