sábado, 30 de maio de 2009

nós sozinhos.



todas as vezes que alguém

di(z)*sser um não

diga:

até então.(final - nem percebi que ouvi um não)

"Just-in-time"

Produto ágil
Imagem unção
(homem negro assobiando – e nos ferrando)
Uniformemente desigual
Chão de fábrica
Olhar sapatos – eles têm classe social.
Sociologia de sapateiro
Produção:(temos que produzir um produto de alta qualidade em um milésimo de tempo para satisfação de uma clientela universal)
Preço da fusão. Fundição. Trabalhão.
De qual mundo?
De que inferno de mundo fala? Universo sem razão. Ração.
Em dois segundos um carrão.
E uma música toca na linha de produção
(don’t worry, be happy!!) E o mundo fala inglês... por que será?
Que sensação de humilhação
Mas o que importa é a exportação.
Porto de junção.
De mundos que nunca se encontrarão.
Ainda não.
Apesar da aculturação.
Eu não falo alemão. Mas o mundo fala inglês, por que será?
(mas não é do Japão?)
Ah. E viva a globalização!!
Cutucão do patrão.
Não pára não.
Supressão da alimentação.
Negociação; flexibilização*; convenção...
Todos levantam a mão.
Viva!!!
Mais ex(s)ploração...

*mais um caso de puro analfabetismo, funcional-sistêmico e necessário,
*mais um caso de neologismo...

"I am not worried, "I am happy"...

sexta-feira, 29 de maio de 2009


"Antes o vôo da ave, que passa e não deixa rastro,
Que a passagem do animal, que fica lembrada no chão.
A ave passa e esquece, e assim deve ser.
O animal, onde já não está e por isso de nada serve,
Mostra que já esteve, o que não serve para nada.
A recordação é uma traição da natureza,
Porque a natureza de ontem não é natureza.
O que foi não é nada, e lembrar é não ver.
Passa, ave, passa, e ensina-me a passar!"
(Alberto Caeiro)


(imagem:emprestada de alguém que emprestou)

quinta-feira, 28 de maio de 2009

Um dia.

terminei a leitura de um livro. Não retive nada dele em mim, sublime, imensamente maior (do) que eu. Olho para ele como uma menina de nove anos, que faz anotações de palavras difíceis ao lado da história. Hoje já consigo escrever Shakespeare sem esquecer nenhuma letrinha. Prazer, o meu, poder sentir tão profundamente algo tão distante. Ajeitei o livro na estante como se guardasse um tesouro. E não fui capaz de evitar um pensamento: espero que o Pedro leia um dia. Então.(... já elaboro um mapa do tesouro... jogarei dentro de um baú em algum lugar perdido. Quem sabe daqui há alguns anos ele... entre uma busca e outra e com alguns mapas na mão, o encontre e fique rico,)...

terça-feira, 26 de maio de 2009

Bolas de sabão

é noite de Santo Antônio. fogos. uma mesa enorme para eu me esconder,
(filho, também me escondia debaixo das mesas)
esconde-esconde: me perdi de mim.
o barulho era de guerra
mas todos rezavam
ladainhas
puxadas pela dona Maria.
que não sabia escrever
mas que fazia passarinho comer na palma da mão. e jardim florescer sem chão.
na época fazia bolas de sabão com as mãos
o fogo era de lenha, a casa de barro. enfeitada de santos e laços
a dor igual
e os olhos profundos
caminhos para o mundo.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

vociferar

vagas ideias
errar ao vaguear vagaros(z)amente um lugar não seu
regrar o ser ao saciar o tempo
produzir milênios
sambar a falta. matar a fome (eu sei qual é a minha fome)
ju(a)ntar lados de medo
devagar vogar. valorar o alívio
divagar entre laços de seda, roto.
"justa"por palavras
imprecisas cisões
pod(b)res argumentos
vagabundo des(se)mundo
vaga-bunda nos valongos (longo vazio a preencher)
vagas abertas
errar.

ler*

O silêncio das sereias
"Para se defender das Sereias, Ulisses tapou os ouvidos com cera e deixou que o prendessem ao mastro. A mesma coisa poderiam, naturalmente, ter feito desde sempre todos os viajantes (à excepção daqueles que já à distância se deixavam atrair pelas sereias), mas todo o mundo sabia que isso de nada serviria. O canto das sereias atravessava tudo, até a cera, e a paixão dos seduzidos teria conseguido soltar-se de mais coisas que correntes e mastros. Mas Ulisses não pensava nisso, embora talvez tivesse ouvido falar de tais coisas; confiava plenamente no bocadinho de cera e no molho de correntes e, cheio da alegria ingénua que lhe davam estes seus ínfimos meios, lançou-se ao encontro das sereias.
Acontece que as sereias têm uma arma ainda mais terrível que o canto . o seu silêncio. Na verdade nunca aconteceu, mas é perfeitamente plausível imaginar que alguém se pudesse salvar do seu canto. Do seu silêncio, certamente que não. Nada de terreno pode resistir à sensação de as ter vencido com as próprias forças, à arrogância que, na sequência disso, tudo derrubaria.
E, de facto, quando Ulisses passou, estas portentosas cantoras não cantaram. Ou porque pensaram que a este adversário só se lhe chegava pelo silêncio, ou porque, à vista da felicidade estampada na cara de Ulisses, que só pensava em cera e correntes, esqueceram de vez a cantoria.

Ulisses, no entanto . se é que assim nos podemos exprimir ., não ouviu o seu silêncio; pensou que elas cantavam, e que ele é que estava impedido de as ouvir; começou por ver nelas, de fugida, os movimentos do pescoço, a respiração funda, os olhos rasos de água, a boca semi-aberta, e pensava que tudo isto acompanhava as árias que ecoavam à sua volta. Mas depressa tudo se desvaneceu diante dos seus olhos postos na lonjura, as sereias desapareceram realmente do seu horizonte, e precisamente no momento em que delas mais próximo esteve é que nada delas pôde saber.
Elas, porém, mais belas do que nunca, espreguiçavam-se, giravam, deixavam esvoaçar os cabelos soltos ao vento, estendiam as garras para se agarrar aos rochedos, já não queriam seduzir, queriam apenas deixar-se captar pelo brilho do grande par de olhos de Ulisses, e quanto mais tempo, melhor.
Se as sereias tivessem consciência, nessa altura teriam sido destruídas; assim, lá ficaram, mas Ulisses escapou-se-lhes.
A tradição, porém, legou-nos ainda um complemento da história. Ulisses, diz-se, era tão manhoso, era uma raposa tal que nem a deusa do destino conseguia ler-lhe na alma. Talvez ele tivesse notado . mas isso já está para lá do entendimento humano . que as sereias estavam caladas, e respondeu-lhes, a elas e aos deuses, com aquele fingimento, de certo modo apenas para se defender."

Franz Kafka.
*ouvir o silêncio de alguém.

terça-feira, 12 de maio de 2009

segunda-feira, 11 de maio de 2009

"Perto de mais"


A mesma sensação de muitos anos. Vem como brisa bater leve na janela da minha alma. Muitos caminhos, nenhuma escolha a fazer, a ordem do dia a organização das coisas parecem existir além de mim. A vida me tem. Penso em um rio, sou criança pescando embaixo da ponte (a)onde vivia um andarilho. (Como esses homens chamam minha atenção desde muito jovem, lembro o nome de todos, sempre recebíamos em casa – estranhos, sujos, famintos, doentes, cheios de histórias para contar... e dividíamos o pão nosso de cada dia). E sentados todos na casa que era a rua conversávamos em família. Na mesma rua da minha casa andava de bicicleta quando olhei para céu, o mesmo que na noite de natal mostrou-me uma estrela cadente enorme amarela. Ninguém acreditou em mim... quando meu pai chegou para ceia contou a mesma história, todos acreditaram em nós. Ele também viu a mesma estrela deslumbrante no céu, eu tinha dez anos no ano que vinha. E o mesmo céu me disse em sussurro que o meu mundo iria um dia acabar, assustada larguei a bicicleta e corri para dentro de casa. Em algum lugar estaria segura e morna.
A mesma sensação de abandono e (des)proteção. Carências irrevogáveis, impossíveis de compor. Retomo o caminho oposto certa de existir alguma certeza na solidão. É esta certeza que não prende nada nem ninguém a mim. O desamor que expiro vem da certeza da impossibilidade de transferir a alguém a responsabilidade de repor em mim o que me nego.


sexta-feira, 8 de maio de 2009

...

Inconstância

Mudar mudo
mudança silenciosa
que de forma estridente
nos conforma.
Olhar longo...
que contempla o que não mais existe.
Saudade,
buraco no corpo
inchaço na alma
E tudo é o mesmo que será.

quinta-feira, 7 de maio de 2009

sonho.

Quiocas e quimbundas no Rio Luena/1970


Lembra do sonho que tive... Acordei assustada e chorosa. Discutíamos sobre um nome que vi em um mapa no museu. Perto da sala que havia homens acorrentados, daquela que você fugiu, chorou antes de ver. Próximo as imagens dos santos que me deixaram com medo. Foi um presságio, Luena, eu dizia que era o nome de uma cidade e você o nome de um rio. Bem, estávamos certos os dois. É um rio que mora na cidade. Nasci em Angola. Morri no Luena.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

lucidez

O beijo - Klimt



e depois (...) cansada de viver
entre o quente e o frio
arrepender-se
docemente perdoar-se
para depois recomeçar
e ouvir novamente o ruído que sai desafinado
dos corpos "treinados" ao movimento de amar
daqueles que não amam
fingem o belo no tédio do gozo
sensação insensível e covarde
do imediato
dos que esperam
a vez
para amar
com fluidez (lucidez)
amar, amar e morrer...

terça-feira, 5 de maio de 2009

graça






Cito-me
a mim
não tenho lugar
o lugar não me tem
sonhei que estava no ventre da minha mãe
o calor era meu
o lugar era eu
sem me ter
passava eu por mim
sito-me
em mim.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Informe*




*informação, conhecimento sumário de coisas banais que acontecem no dia-dia. A imagem e a frase: procurei, procurei, mas não achei...:anômim@.

nanopoema





"Infinito(u)*zinho"

Arnaldo Antunes

*as pessoas têm medo do erro. transcrevendo a dificuldade de ler,

domingo, 3 de maio de 2009

FEsTO

Ele olhou bem no fundo dos olhos dela. Estava deitada, esperava, sem receios. A hora naquele dia enganou os dois, haviam perdido o caminho, esquecido o que faziam, e assim retornaram para o começo que implorava por um fim. Ele fingia segurança, conferiu(o) calmamente, qual a profundidade do medo e segurando na ponta dos dedos, levou para dentro a certeza sem futuro, ou melhor, de um outro futuro (não mais que um broto de feijão, só que branco). Ele disse que era capaz de desejá-la naquele instante, ele disse: Ela disse: amo você. "Doeu?" Não, está tudo bem. Seguiram para casa, agora, os dois esperavam, e, a música era "cantada" no rádio, como transmutação. Conversavam. O assunto era o mesmo de sempre, algo relacionado ao trabalho dele, aos direitos sobre o corpo, à liberdade de decidir, ao que a música queria dizer, ao que o livro disse, coisas sem conexão. Ela tentava esconder um sorriso de vaidade, a preocupação e o cuidado que ele doava, tiravam dela um sentimento de soberba, porque nada possuía. Não importava as dores e os espasmos, nem o medo, que ainda não existia, precisava ser inventado.Logo, coágulos e choros noturnos, acompanhados de alguém. Palavra sentida: esfacelar-se. Ele insistia em "vazio". Discordavam, no entanto. Sol, comemoração pela manhã. Algum tempo para cicatrizar, não cicatrizou. Naquele final de semana não se(nos) beija(mos)ram, lembro, um, único beijo... gelado, doce, inesquicível. Quando uma semana depois, ela, apareceu deitada na maca toda azulada, mas viva, ele surpreso disse: "você está sorrindo", mais parece uma santa. Ela não disse: não amo você.clara maré